Friday, July 06, 2007

Palavra de Especialista

O SURGIMENTO DO PENSAMENTO EVOLUTIVO: DE ANAXIMANDRO A LAMARCK

&

HISTÓRICO E ORIGEM DAS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES ERRÔNEAS SOBRE EVOLUÇÃO BIOLÓGICA, BEM COMO DAS CONCEPÇÕES CRIACIONISTAS

DAVID G. BORGES

BIÓLOGO, GRADUANDO EM FILOSOFIA

(EXTRAÍDO DAS PALESTRAS E TEXTOS SOBRE EVOLUÇÃO VS. CRIACIONISMO ELABORADOS PELO AUTOR EM OCASIÕES ANTERIORES)

Anaximandro (610-546 a.C.): Especulou sobre o início e a origem da vida animal. Afirmou (com base em fósseis) que os animais saíram do mar em épocas remotas e o ser humano se encontraria “preso” dentro de animais similares a peixes; o homem não teria tido, no passado, condições de sobreviver sozinho sem se abrigar dentro dos peixes, e por isso suas características teriam mudado ao longo do tempo (primeiro registro da idéia de que seres vivos se modificam com o tempo).

Platão (428-347 a.C.): Formula o “Mundo das idéias” e teoria das formas; para Platão variações seriam reflexos “imperfeitos” das essências. Pelo princípio da plenitude, tudo teria sido criado (fixismo).

Aristóteles (384-322 a.C.): Afirma que as espécies poderiam ser organizadas em uma “ordem”, da mais baixa até a mais alta; o universo seria perfeito e portanto esta “cadeia” também o era, não havendo “espaços vazios” entre um “degrau” e outro. Nenhum degrau seria representado por mais de uma espécie. Aristóteles deu origem ao mito de que “evolução” implica em alguma forma de “progresso”. Ironicamente, também é ele quem lança as bases do que viria a ser o método científico com os seus trabalhos sobre lógica.

Taoísmo (séc. IV a.C.): As espécies se modificam com o tempo, não são “fixas”.

Veddas (séc. II a.C.): As encarnações de Vishnu como mudanças entre uma espécie e outra.

Cícero (106-43 a.C.): Antecipa a “analogia do relógio”; argumenta que, assim como um relógio de sol ou de água, os seres vivos são complexos demais e devem ter sido projetados por algum ente externo. Os escritos de Cícero são “revisitados” por William Paley no séc. XIX e dão origem ao fenômeno do “criacionismo”.

Galen, o estóico (129-200 d.C.): Escreve uma obra chamada “sobre a utilidade das partes do corpo” e argumenta contra a visão judaica de que seres vivos foram criados de forma miraculosa; fala sobre a natureza como fator limitante para certas coisas.

Agostinho de Hipona (354-430 d.C.): Argumenta que o Gênesis bíblico deve ser interpretado de forma alegórica, e adverte os fiéis a não se precipitarem em suas conclusões, pois isto poderia “desacreditar a fé”.

Al-Jahiz (776-869 d.C.): Afirma que o ambiente influencia a possibilidade de sobrevivência de um animal.

Ibn al-Haitham (965-1039 d.C.): Escreve um livro falando sobre modificação (evolução) das espécies. Também foi o pioneiro do método científico – seus livros foram amplamente discutidos e chegaram até o ocidente traduzidos para o latim durante a renascença, formando as bases para o método científico ocidental.

Roger Bacon (1214-1294 d.C.): Principia o que posteriormente viria a se tornar o método científico, com a defesa de um processo repetitivo de observação, formulação de hipóteses e experimentação, além da necessidade de verificação independente.

Francis Bacon (1561-1626 d.C.): Após estudar várias “ciências”, afirma que os métodos até então empregados para o estudo das coisas obtinham resultados errôneos e defende a criação de um novo método. Tenta estabelecer as causas dos fenômenos a partir de um método indutivo, porém diferente do aristotélico. Tenta “falsear” os conhecimentos adquiridos através de histórias experimentais, para eliminar teorias alternativas. É o precursor do método indutivo e do princípio de falseabilidade de Karl Popper.

Galileu Galilei (1564-1642 d.C.): Realiza uma série de experimentos a partir de um método completamente diferente do aristotélico, utiliza a matemática como ferramenta e faz duras críticas ao aristotelismo.

René Descartes (1596-1650): Modifica por completo o método científico e filosófico, abandonando (pelo menos em aparência) o aristotelismo. Cria um novo sistema que tem como pretensão guiar os princípios da pesquisa científica.

Séc. XVII: O termo em inglês “evolution”, derivado do termo latino “evolutio” – que significa “desenrolar-se como um pergaminho” – começa a ser usado para designar uma seqüência ordenada de eventos, particularmente uma em que o resultado estava de alguma forma, contido no início.

Matthew Hale (1609-1676 d.C.): Critica o atomismo “ateu” de Demócrito e Epicuro, dizendo que uma “coalizão fortuita e sem sentido de átomos mortos” jamais poderia ter dado origem ao homem, pois não continha os princípios da “evolução” do mesmo. Hale deu origem ao mito de que “evolução” fala de cosmologia, da origem do universo e da origem da vida, além de tê-la associado a “ateus”.

John Locke (1632-1704 d.C.): Defende que todo conhecimento deve vir da experiência, e não de argumentos de autoridade. Afirma que o ser humano é uma “tabula rasa”, ou seja, não possui conhecimentos inatos (o que contrariava as idéias de Descartes e da Igreja). Forneceu as bases para os trabalhos de Hume e Kant. É considerado o primeiro empirista da escola inglesa.

Isaac Newton (1643-1727 d.C.): Rejeitando a ênfase de Descartes no racionalismo e se aproximando do empirismo de Bacon, Newton estabelece o principia, um conjunto de regras que serviram como base para todo o pensamento científico do século XVIII e início do século XIX. Como suas descobertas entravam em concordância com as de Kepler, Newton demonstrou que as mesmas leis naturais que governam o movimento dos corpos celestes também se aplicam ao movimento dos objetos na Terra.

Carolus Linneaus (Carl von Linné; 1707-1778 d.C.): Cria a nomenclatura e a taxonomia. Também forneceu os princípios para a ecologia atual. Irritou a igreja ao classificar humanos como primatas.

David Hume (1711-1776 d.C.): Argumentou a favor do naturalismo; as coisas surgiriam de processos naturais e qualquer impressão de “ordem” seria mera projeção humana sobre as forças da natureza. Levou o ceticismo ao máximo, elaborando o “problema da indução” – segundo o qual nada poderia ser afirmado com certeza a menos que houvesse sido observado. Firma as bases para o método indutivo. Hume também argumentou contra a idéia de que seres vivos eram “projetados” por algum ente externo, com inúmeros exemplos de monstruosidades, abominações e formas imperfeitas presentes na natureza, além do uso da probabilidade como ferramenta.

William Paley (1743-1805 d.C.): Usando uma série de exemplos retirados da medicina e da história natural, Paley retoma o “argumento do relógio” de Cícero e o usa para afirmar que o universo foi “projetado” por uma divindade, em oposição às idéias de Hume. O “argumento do relógio” posteriormente deu origem à corrente criacionista conhecida como “desenho inteligente”.

Friedrich Hegel (1770-1831 d.C.): Afirma que o universo é cheio de contradições auto-complementares e a evolução do mesmo faz parte de um “todo” racional, a que chamou de “conhecimento absoluto”. Hegel é o responsável pelo mito de que a evolução possui uma finalidade metafísica.

Joseph Schelling (1775-1854 d.C.): Considera natureza e espírito como partes “complementares” de um todo; assim como a natureza exibe estágios dinâmicos de evolução biológica, a mente “luta” para adquirir consciência de si própria; a natureza é “uma revelação do absoluto que se auto-expõe”. Schelling é o responsável pelo mito de que a evolução biológica está ligada a características “intelectuais” e metafísicas (e também influenciou profundamente o surgimento do espiritismo no séc. XIX).

Hans Christian Ørsted (1777-1851 d.C.): Tenta unir o empirismo de Hume às críticas feitas ao mesmo por Kant. Estabelece o método de “observação, hipótese, dedução e experimentação”. Afirma que para se atingir completo conhecimento da natureza, deve-se partir de dois extremos ao mesmo tempo – a experiência e o intelecto em si mesmo.

William Whewell (1794-1866 d.C.): Cria o método hipotético-dedutivo. É o primeiro a utilizar o termo “cientista”.

John Stuart Mill (1806-1873 d.C.): Descreve os cinco princípios básicos da indução (o “método de Mill”). É considerado o último empirista.

Gregor Mendel (1822-1884 d.C.): Pai da genética moderna. A partir de estudos com ervilhas elaborou leis que descreviam os mecanismos da hereditariedade. No entanto, os trabalhos de Mendel só vieram a receber a devida atenção a partir da década de 1930. Por este motivo, nem Lamarck nem Darwin utilizaram as descobertas de Mendel para a elaboração de suas teorias.

5 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Muito interessante! Compilou bastante informação útil em um texto curto e simples.

12:48 PM  
Blogger Leonardo said...

Também gostei!
Vem mais depois?

1:50 PM  
Blogger juliana kramer said...

Muito bom... Ao mesmo tempo foi objetivo e abrangente.

4:23 PM  
Anonymous Anonymous said...

Poxa... O Renan e o Agnon tiraram as palavras da minha boca!!!

Parabéns, ô samurai!!=D
Excelente!!

4:20 AM  
Blogger Unknown said...

Grande David,

Tenho uma sugestão, falar um pouco do Animismo, do Vitalismo, do Finalismo, Teologia Natural, Darwinismo, Neo. Colocar estas figuras históricas em cada uma destas concepções filosóficas.

Mega abraço!

11:08 PM  

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